Lidiane Mazzoni, Advogada, Mestre em Saúde Coletiva, Sócia de Mazzoni Advocacia.
Leonardo Ramos Nogueira, Advogado, Especialista em Compliance de Saúde, Sócio de Mazzoni Advocacia.
No intuito de buscar um sistema de saúde sustentável e focado na saúde do paciente, temos visto a crescente discussão de alternativas ao modelo tradicional de pagamento de serviços. Desta feita, no presente artigo vamos discorrer sobre os pontos relevantes dos principais tipos de modelo de pagamento baseado em valor, na eficiência e resultados dos tratamentos e atendimentos.
Fee For Service – Pagamento por Serviço
O modelo de pagamento por serviços é o método comum e hegemônico no setor de saúde, no qual as instituições de saúde e prestadores realizam a cobrança para cada um dos serviços, medicamentos, materiais e procedimentos realizados, pré-estabelecidos em uma tabela. Nessa forma de precificação não se considera exclusivamente a qualidade, eficiência, prevenção e promoção da saúde do paciente ao longo prazo, acarretando a realização de serviços que muitas vezes não são necessários, principalmente com remuneração mais elevada.
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Pagamento por Diárias Hospitalares
Trata-se de um modelo específico para pagamento de tratamentos realizados em regime de internação hospitalar, sendo estabelecido um valor unitário por cada diária que o paciente permanecer no hospital. No valor definido de diária já estará incluso gastos com materiais, medicamentos, exames e honorários médicos, além dos gastos de hotelaria.
Referido modelo proporciona transparência no custo, uma vez que os pacientes podem facilmente calcular o valor total do tratamento com base no número de dias internados. Além disso, para casos de internações mais breves ou menos intensivas, esse modelo pode ser mais econômico do que o pagamento por procedimentos individuais.
Por outro lado, o modelo pode não ser a melhor opção para situações em que os pacientes precisam de uma variedade de procedimentos médicos complexos em um curto espaço de tempo. Nessa situação, os custos podem ser significativamente mais altos do que se o pagamento fosse baseado em tratamentos específicos.
Referido modelo também pode criar um incentivo para que hospitais mantenham os pacientes internados por mais tempo do que o necessário, trazendo ineficiência para a gestão do serviço e podendo até prejudicar a saúde do paciente.
Pagamento por Performance
O pagamento por Desempenho ou Performance não é um modelo de remuneração em si próprio, sendo necessário ser atrelado com outro modelo de pagamento, como o próprio Fee For Service. Assim se afirma, pois o pagamento por performance estabelece valores a serem pagos ao prestador ou à instituição de saúde, de acordo com o desempenho e resultados obtidos no atendimento ao paciente.
Para isso é necessário indicadores para medir o desempenho dos profissionais, prevendo o pagamento de remuneração quando verificado determinado resultado. O profissional ainda será remunerado por outro modelo de pagamento, recebendo por todo serviço prestado, vindo este valor a ser modificado positivamente em razão do resultado.
O modelo tem como objetivo o aumento da eficiência e, consequentemente, redução dos custos dos serviços de saúde e aumento da qualidade do atendimento.
A crítica existente é a possibilidade de os profissionais atuarem com foco excessivo em indicadores específicos e, com isso virem a negligenciem pacientes com quadros clínicos mais graves, que dificultem o atingimento das metas e indicadores. A aplicação inadequada desse modelo pode gerar desassistência pela referida seleção e atraso no atendimento de pacientes em níveis mais complexos.
Capitation – Captação
Trata-se de abordagem de remuneração em saúde que visa simplificar o sistema de pagamentos ao fornecer um pagamento fixo por paciente inscrito, independentemente do volume ou custo dos serviços prestados. Nesse modelo, os prestadores de serviços de saúde recebem um valor pré-determinado por período para cada indivíduo inscrito em sua carteira de pacientes.
Pelo fato de ocorrer a assunção do risco financeiro, torna-se necessária a gestão de saúde dos pacientes, com atendimento focado na prevenção, evitando encaminhamentos desnecessários para especialistas ou serviços de alto custo. Quando aplicado de forma adequada, temos como ponto positivo o desenvolvimento de uma maior coordenação do cuidado do paciente, em razão do acompanhamento contínuo.
Já os pontos negativos são justamente o contrário do acima mencionado, eis que os prestadores podem diminuir o acesso, a qualidade e a quantidade dos serviços, para diminuir os custos.
Pacotes – Bundles
Neste modelo de pagamento, ao invés em vez de termos o pagamento por cada serviço médico individualmente, a precificação ocorre por agrupamento em pacotes completos para o tratamento de uma condição específica ou para um conjunto de serviços relacionados a um episódio de cuidados previamente estabelecidos. Pode ser utilizado apenas para uma cirurgia ou também por um período de pós-operatório, sendo comumente utilizado em cirurgias plásticas e serviços de obstetrícia no parto ou desde o pré-natal.
Ao mesmo tempo que visa controlar os custos, em razão da previsibilidade, possibilita melhora na qualidade e eficiência, pelo fato de termos foco na jornada do paciente em um determinado período.
Dentre os pontos negativos desse modelo podemos citar a possibilidade de seleção adversa de pacientes, evitando-se pacientes mais complexos ou com situações de maiores riscos, que podem gerar mais gastos. Também há o desafio de definição dos pacotes, para evitar o subfaturamento ou superestimação dos custos.
Diagnosis Related Groupings – DRG – Sistema de Classificação dos pacientes
Neste modelo, os pacientes são categorizados com base em diagnósticos, tratamentos e características clínicas similares, e agrupados em categorias específicas. Para cada grupo de diagnóstico é atribuído um valor fixo, previamente estabelecido. Assim, o pagamento é determinado pelo diagnóstico principal e quaisquer outros diagnósticos secundários associados durante a internação ou tratamento.
O modelo incentiva a eficiência, pois o pagamento é padronizado independentemente dos recursos utilizados. Dessa forma, os prestadores são motivados a adotar práticas mais eficientes e reduzir custos sem comprometer a qualidade do cuidado. Além disso, o DRG facilita a comparabilidade dos custos e resultados entre diferentes instituições e regiões, contribuindo para uma maior transparência e melhor gerenciamento do sistema de saúde como um todo.
A crítica deste modelo consiste na possibilidade de acarretar a alta rotatividade de pacientes, através de alta precoce, a fim de reduzir custos. Além disso, existe o desafio de garantir que a classificação dos pacientes em grupos seja precisa e justa, refletindo adequadamente a complexidade do quadro clínico.
Patient-Centered Payment System – Modelo de Pagamento Centrado no Paciente
O modelo de custeio centrado no paciente pode ser visto como a criação de uma alternativa, visando o estabelecimento de modelo de pagamento efetivamente baseado em valor. Ele deve levar em consideração determinados nichos e demandas de cuidados de saúde específicas por uma equipe de prestadores de serviços que atuam com o objetivo de prestar serviços com qualidade, eficiência e bons resultados.
A partir da reunião dessas equipes, os pacientes poderão contratar e escolher os prestadores que preferem, a partir das informações de resultados de cada uma delas, mas sempre de acordo com um valor total de pagamento particular ou pelo seguro ou plano de saúde.
Por sua vez, as instituições de saúde devem disponibilizar infraestrutura adequada para que as equipes possam prestar o referido serviço de qualidade e com prazos adequados com a natureza, complexidade e gravidade dos quadros dos pacientes. Por fim, o que se espera é que haja um pagamento justo e negociável, com base na qualidade dos serviços e a responsabilidade assumida pela equipe.
Trata-se de um modelo em que teríamos diversos pacotes de serviços, mas criados e estabelecidos com foco no paciente.
Reflexão Final
Pela análise dos referidos modelos fica evidente que não temos um modelo de custeio perfeito ou ideal. Cabe então aos profissionais e as instituições de saúde analisarem quais desses modelos, de forma isolada ou em conjunto, se adequam melhor e podem trazer resultados mais eficientes para sua realidade, com o intuito de trazer benefícios para a jornada de cuidado do paciente e para sustentabilidade financeira da empresa e entrega de resultados para o setor como um todo.