Dr. Eduardo F. Motti
Sócio Gestor da Consultoria Trials & Training
No dia 26 de setembro, o Governo Federal assinou o decreto sobre a Estratégia Nacional para o Desenvolvimento do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Serão R$ 42,1 bilhões a serem investidos até 2026. Nunca antes neste país… É uma ótima notícia! Mas a sociedade precisará vigiar de perto o cumprimento das promessas feitas pelo presidente e sua Ministra da Saúde.
Uma questão a esclarecer, por exemplo, é a importância que será dada à pesquisa clínica nos novos planos. O texto do decreto e os slides apresentados pela Ministra não trazem uma só palavra sobre o tema. Vamos imaginar que em 2026 a indústria nacional de medicamentos e equipamentos médicos esteja trabalhando a todo vapor na criação de produtos que venham melhorar o acesso da população à saúde. Esses produtos, gerados pelas PDPs, antes de chegar ao mercado, precisam ter aprovação da ANVISA quanto à sua segurança e eficácia. Para isso precisam ser testados extensivamente nas diversas fases da pesquisa clínica. Onde serão feitos os testes? E por quem? Vamos contratar as pesquisas em outros países, como algumas indústrias nacionais são obrigadas a fazer hoje? Nesse caso, nossa dependência externa permanecerá, só mudarão os fornecedores.
A pesquisa clínica gera conhecimento e empregos de ótima qualidade, promove o acesso a novos tratamentos e desonera o SUS, pois os tratamentos são bancados pelos fabricantes, e melhora o padrão assistencial em geral. Tudo isso sem a necessidade de grandes investimentos, pois utiliza a infraestrutura já existente. Ainda assim, não está declarada no novo decreto. Haverá algum esforço para a capacitação de mais recursos humanos e uma mudança de mentalidade de órgãos do governo, que insistem em travar os esforços dos pesquisadores, impondo barreiras burocráticas, alfandegárias e ideológicas?
A pesquisa clínica feita aqui hoje é predominantemente vinda do exterior. Dados da ANVISA mostram que apenas 7% dos estudos aprovados são de empresas nacionais. Isso não significa que sejamos meros prestadores de serviços, pois muito conhecimento atrelado aos estudos é dividido com nossos pesquisadores, que se capacitam para melhorar seus próprios protocolos. A pesquisa global também ajuda o Brasil a se inserir cada vez mais na comunidade internacional da ciência. Temos o exemplo da ANVISA, que se tornou membro pleno da comunidade que regulamenta e fiscaliza as pesquisas de medicamentos (www.ich.org).
As empresas estrangeiras patrocinadoras das pesquisas trazem divisas para realizar seus estudos no Brasil, apesar dos problemas enfrentados. São aprovados cerca de 300 estudos por ano na ANVISA (menos de 2% do que ocorre no mundo), poderíamos multiplicar isso por 3 a 5 vezes facilmente, se as barreiras fossem retiradas. Isso não significa uma “facilidade” para as multinacionais, pois os estudos que elas não fazem aqui, fazem em outros países. Significa ganhos de escala, fomento na infraestrutura e empregos, dos quais a indústria nacional se beneficia. Pois ela, se não fizer suas pesquisas aqui, terá de pagar muito mais caro para fazê-la no hemisfério Norte.
Investimentos e verbas são importantes, mas há muita coisa que pode ser feita apenas com vontade política.